Em função da pandemia de Covid-19, o uso de antissépticos baseados no etanol tornou-se “obrigatório” para higienização das mãos e superfícies. Desses antissépticos, o álcool em gel tem sido o mais utilizado e é recomendado pelos órgãos de saúde por questões de segurança e eficácia. Só que uma análise realizada por pesquisadores da UFV indicou que nem sempre o álcool em gel disponível no mercado tem essas características. Das 41 amostras de antissépticos analisadas pelos pesquisadores em Viçosa, 19 apresentaram teores de etanol inferiores aos 70% (m/m) recomendados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Dessas, sete amostras continham etanol em teores inferiores a 62%, que é o mínimo necessário para se conseguir eficácia na neutralização do novo coronavírus (SARS-CoV-2), causador da Covid-19.
A análise foi possível graças a um método desenvolvido pelos pesquisadores, baseado em Espectroscopia de Infravermelho Próximo (NIRS), uma tecnologia amplamente utilizada para análises quantitativas e qualitativas de sólidos, líquidos e gases. O método foi descrito em um artigo recentemente publicado no Microchemical Journal. Assinam o estudo os professores do Departamento de Química Maria do Carmo Hespanhol e Alexandre Fontes Pereira; o professor do Departamento de Solos Celio Paquini, coordenador do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA), da Unicamp, e o doutorando do Programa de Pós-Graduação em Agroquímica da UFV, Kaíque Augusto Moreira Lourenço Cruz.
No artigo, eles descrevem o método a partir do uso de um espectrofotômetro NIR portátil, de baixo custo e com um protocolo simples de medição de amostra. Os pesquisadores explicam que, para determinar a quantidade de etanol nos produtos comerciais, pode-se utilizar a tecnologia NIRS. Isso aconteceu, por exemplo, para determinar o teor de etanol de bebidas e destilados, e também para avaliar a qualidade do etanol combustível e a quantidade de álcool aditivo encontrada na gasolina.
O que os pesquisadores da UFV fizeram foi estender o uso da NIRS como uma técnica rápida, benigna ao meio ambiente e econômica para monitorar a qualidade de sanitizantes à base de etanol. A descrição de métodos analíticos para esse monitoramento ainda é rara na literatura sobre o assunto. O método baseado em NIRS se mostrou eficiente nas análises diretas das amostras, permitindo um controle rápido (um minuto) da qualidade dos antissépticos, empregando um volume de apenas 120 microlitros. Além disso, utilizou instrumentação de baixo custo. O equipamento portátil usado pelos pesquisadores tem um custo aproximado de US$1 mil. Esse valor permite que, diferentemente de outros equipamentos, cujo custo ultrapassa US$20 mil, a tecnologia NIRS seja utilizada por pequenos fabricantes e agentes de fiscalização.
Perspectivas
A possibilidade de se ter uma análise eficiente e mais acessível pelo NIRS se configura como um avanço importante, levando-se em conta o aumento da ocorrência de fraudes ou produção de antissépticos fora das especificações recomendadas pela Anvisa. Isso se deu, segundo os pesquisadores, pelo fato de a Agência ter flexibilizado as normas para a produção dos antissépticos em função do aumento da demanda por álcool em gel. A flexibilização inclui, por exemplo, a possibilidade de fabricação e comercialização de sanitizantes à base de etanol por pequenas empresas sem prévia autorização do órgão regulador.
Para minimizar as fraudes e a baixa qualidade do álcool em gel, é importante, portanto, que se verifique o teor de etanol, que deve estar entre 62 e 71% (m/m) para assegurar a eficiência na desativação do novo coronavírus. Por isso, é necessário dispor de técnicas e métodos analíticos que permitam determinar o teor de etanol em antissépticos com rapidez e exatidão.
O espectrofotômetro NIR utilizado pela equipe de pesquisadores foi previamente avaliado quanto ao seu desempenho em longo prazo com excelentes resultados, considerando a relação custo/benefício. O pacote de software quimiométrico “R” disponível gratuitamente pode ser usado para realizar a análise multivariada de dados espectrais caso um software comercial não esteja disponível. O procedimento analítico é simples. Os fabricantes podem produzir seus modelos (com a composição desejada) para melhorar o desempenho e controlar, de forma eficaz, a qualidade do sanitizante e das matérias-primas empregadas na sua fabricação.
O trabalho publicado disponibiliza para os fabricantes e os órgãos responsáveis pela fiscalização um método analítico capaz de garantir a qualidade dos antissépticos produzidos e utilizados em larga escala durante a pandemia. O método está descrito em detalhes no artigo e pode ser utilizado, sem restrições, por qualquer empresa ou órgão de fiscalização, segundo os pesquisadores.
A pesquisa teve o apoio do CNPq, Fapesp e Capes e também das empresas Clorofitum Amaral Marques Indústria de Comércio LTDA e Indústria de Cosméticos Haskell Ltda, que forneceram a maioria dos reagentes empregados no estudo.
Divulgação Institucional
Fonte: https://www2.dti.ufv.br/noticias/scripts/exibeNoticiaMulti.php?codNot=33042&link=corpo